sábado, 3 de setembro de 2011

O último vôo.

Metrópole, Rio de Janeiro, Copacabana. Prédios se enfileiram em frente à praia, como uma arquibancada onde os espectadores são os altos pilares de concreto e o mar é o palco do espetáculo. Lá pela quarta ou quinta fileira de prédios, mais para dentro do bairro, um menino se debruça na janela do terceiro andar. Deve ter sete, oito anos no máximo. Sua mãe fora de casa, a empregada lavando roupa despreocupadamente enquanto o menino já está do umbigo pra cima para fora do parapeito.
Despreocupado, sem medo das rajadas de vento, sem medo da velha grade que servia de proteção quando era mais novo, mas que agora se tornou enfeite, dispositivo obsoleto em conter a curiosidade e a inquietude desta criança que gosta muito de super-heróis que voam, aviões de papel, e todo o tipo de coisas que têm desprezo pela lei da gravidade. Já sonhara algumas vezes com seus amigos o chamando lá embaixo para jogar bola, e ele se jogava da janela, caindo em pé, sem se machucar, para encurtar o caminho. Sonhos recorrentes... Voar com Peter Pan, olhar a cidade lá de cima com uma donzela no colo como Clark Kent faria, dar loopings no ar pilotando o tapete do Alladin...
O tempo está bom lá fora. Uma brisa acaricia seu corpo como um amigo que lhe dá a mão para subir um degrau mais alto. Os pombos da cidade passam perto da janela, fazendo curvas e movimentos de aterrissagem. O cartucho do jogo de aviões do Super Nintendo ainda está quente, recém jogado. A empregada escuta Leandro e Leonardo no rádio, e está terminando de torcer as últimas peças de roupa, enquanto o menino se sente cada vez mais leve, olhando a distância entre ele e o chão. É como se voasse parado, como se flutuasse. Não sente o peso de seu corpo. Olha para os prédios vizinhos imaginando-se decolando e imitando os pombos, visitando cada hora uma cobertura, uma janela, um aparelho de ar-condicionado.
Um momento de distração da empregada, uma visão fugaz... Algo cai pela janela. O barulho do impacto com o solo ecoa no vão que fora utilizado como caminho para o encontro com o chão. Um barulho desagradável, barulho de destruição, um barulho que não gera bom pressentimento à doméstica, que agora larga o que está fazendo e se dirige para a sala, onde tem uma visão diferente do que é acostumada. Duas linhas marrons dançam no ar, gêmeas, embaladas pelo sabor do vento. Elas são um pouco mais grossas que macarrão, mas brilham. O sol reflete em suas curvas e o brilho fica percorrendo o corpo daquelas linhas marrons metálicas... Algo que ela demora a reconhecer e quando consegue sua cara muda rapidamente a fisionomia, de estranheza e curiosidade para terror, horror, espanto. Corre para a janela, olha para baixo. Lá ao fim da linha jaz inerte, imóvel, aos pedaços... Sua fita preferida do Zezé de Camargo e Luciano.

Um comentário:

Gabriel Carvalho disse...

Não esperava outra atitude desse menino!!
Força no blog mlk!! Vc ainda vai voar muito alto